Por que não a 24? Por Felipe Blanco
Devido a uma bolsa de apostas, criada em 1892, para impulsionar vendas e visitas a um zoológico situado no Rio de Janeiro, o número vinte e quatro seria ampla e permanentemente associado a homossexualidade, no Brasil, mesmo após longos 128 anos.
No referido zoológico havia uma premiação em dinheiro a quem detivesse um bilhete de entrada com a figura do “animal do dia”. Uma lista com vinte e cinco animais ficava armazenada dentro de uma caixa, e após o dia de visitações, uma das figuras era revelada, oferecendo momentos de ansiedade e grande entretenimento ao público. Logo a ideia se popularizou, os animais ganharam números na loteria e o jogo ultrapassou a barreira física do zoológico, se tornando a maior loteria ilegal do mundo.
O vinte e quatro representava o veado no então disseminado “jogo do bicho”. E por que o veado é associado a homossexualidade? Há algumas especulações: Devido ao animal praticar relações entre o mesmo sexo (o que não é exclusividade da raça), alusão ao Bambi da Walt Disney, ou – dentre outras possibilidades não citadas – por ser similar a palavra “transviado”, utilizada antigamente, cujo significado é o que se transviou; extraviado, perdido, ou aquele que não obedece aos padrões comportamentais vigentes.
Fato é que este número recebeu uma conotação negativa, e foi praticamente abolido por homens no futebol brasileiro, como você pode conferir com mais detalhes nesta excelente matéria do Marcos Guedes da Folha de São Paulo.
O místico 24 tomou os noticiários e portais nos últimos dias, desta vez, através do Corinthians. A homofobia enraizada veio à tona por meio do comentário do seu diretor de futebol, Duílio Monteiro Alves, que resolveu “brincar” sobre o número da camisa de Victor Cantillo. O atleta colombiano sempre utilizou a 24, contudo, recebe a 8 no alvi-negro. Diante das câmeras, o cartola afirma: “24 aqui, não” na apresentação oficial do recém chegado. A frase infeliz percorreu a web e causou revolta, absolutamente justificada.
O diretor teve de se retratar, e o clube voltou atrás na decisão de proibir a camisa 24. Que inclusive já fora o número do maior ídolo atual da equipe, o goleiro Cássio.
Foto: Marcos Ribolli
(Clique na imagem e confira a entrevista explicativa de Duílio para a DAZN)
(Clique na imagem e confira o pedido de desculpas de Duílio no Youtube)
O Sport Club Corinthians Paulista é um time de massa, dono segunda maior torcida do país, com milhões de fiéis torcedores. Essa atitude pode não refletir o que é a instituição Corinthians, mas quando um diretor faz esse tipo de declaração publicamente, a marca paga a conta. Neste caso, a imagem do colaborador precisa ser descolada do clube e ser prontamente rebatida pela instituição. É a gestão de crise.
Mas a retratação não impediu que a polêmica se alastrasse. Ela motivou diversos clubes se posicionarem contra o preconceito que atrela número e homossexualidade, nutrindo a homofobia dentro do esporte.
(Clique na imagem e saiba mais sobre a campanha da revista Corner)
No ano passado, escrevi aqui no Brand Bola, uma coluna sobre o Tabu da masculinidade no futebol, ao mostrar que os clubes ainda tem receio de demonstrar apoio a causa homossexual. Confira no link:
Os clubes dependem de seus torcedores para serem o que são e existirem no futuro. Este é o seu maior ativo. Nenhum tipo de ser humano pode ser negligenciado apenas pela sua forma de demonstrar amor, isso é inconcebível em pleno ano de 2020. A fala homofóbica de Duílio não é a posição do Corinthians, mas os clubes são feitos de pessoas e muitas delas precisam mudar suas posturas para que a sociedade viva em paz, harmonia e seja mais igualitária.
O futebol é de todos, ele proporciona a situação e o local ideal para que todo tipo de ser humano conviva e se emocione junto, ele já freou guerras! Como planejar e criar ações de marketing, planos de sócio torcedor, atendimento exclusivo, camarotes e belíssimas campanhas publicitárias para desenvolver paixão e aproximação, se ao mesmo tempo seu clube discrimina torcedores?