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Ticketing não é apenas vender ingressos | por Ricardo Brito Teixeira

Ticketing é uma área complexa e envolve diferentes vertentes como comercial, tecnologia, finanças e atendimento ao cliente, entre outras. A principal atividade, obviamente, é vender ingressos. No entanto, vai além disso.

Hoje em dia, a indústria de Ticketing está fragmentada devido a várias soluções relacionadas aos serviços, o que produz uma quantidade massiva de dados, criando um cenário onde os clubes precisam gerenciar todas essas informações com precisão. Vender ingressos não é o único fator determinante; a tendência é tratar bem os dados para oferecer o melhor acesso e integrá-los a vários produtos e serviços.

Por esses motivos, os clubes estão se voltando para plataformas que podem integrar todas as principais áreas e serviços, personalizadas para suas necessidades, evitando empresas com soluções engessadas.

Vivenciando algumas práticas em um clube de futebol e grandes eventos, agora combinadas com o conhecimento que venho adquirindo nas aulas ministradas por executivos envolvidos na industria do Futebol na The Football Business Academy (The FBA), com exemplos práticos e teóricos sobre Operações de Arenas, Marketing Digital, Patrocínio e Estratégia Financeira; certamente, serei um profissional melhor e mais preparado.

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Com isso em mente, apresentarei uma visão geral de como o Ticketing é praticado e estruturado em um clube de futebol e em grandes eventos. Para os clubes, será mostrado como a plataforma interage com inúmeras atividades de outros departamentos; para grandes eventos, como a área de Ticketing é projetada dentro dos Comitês Organizadores Locais e das Confederações.

Quem organiza um evento tem como pretensão facilitar a compra do ingresso e o acesso para alcançar um número significativo de público e dar a melhor experiência aos torcedores. No futebol, os principais organizadores são os clubes e as Confederações/Federações através dos seus campeonatos (ex. Copa do Mundo da FIFA e Liga dos Campeões da UEFA).

Para os clubes de futebol, os “season tickets” (carnê de ingressos), pacotes e programas de sócios-torcedores são produtos que garantem a venda de ingressos durante toda a temporada, pois, os torcedores podem comprar ingressos com antecedência e garantir seus lugares. Os primeiros são mais comuns na Europa, enquanto os últimos são bem aplicados na América do Sul, principalmente no Brasil.

Para as Confederações e seus torneios, o método mais utilizado ainda é a “compra pura” por meio de vendas na web e bilheterias, oferecendo ingressos individuais ou pacotes.

No passado, comprar um ingresso para um jogo concorrido era praticamente impossível. Era preciso se movimentar para adquirir aquele papel que permitiria sua entrada: ir até um local físico de venda, enfrentar filas de dias, cambistas em maior quantidade, entre outros. E no evento: problemas com filas nos acessos e mais cambistas. Hoje, pela internet, é possível comprar ingressos através de um site de vendas e aplicativos para celular; receber os ingressos diretamente nas carteirinhas de sócio, Apps, e-wallets, imprimir em casa, etc. Devido a esse novo modelo, investir em soluções que facilitem a compra e acesso é obrigatório. Lembrando que deve-se gerenciar cuidadosamente tudo isso do início ao fim do processo.

Em um clube de futebol, uma plataforma ticketing é construída para atender o público geral, detentores de season tickets, sócio torcedores, clientes de hospitalidade, clientes internos, parceiros, patrocinadores etc. Ela precisa se comunicar com o CRM, com o app, e-commerce, contabilidade, controle de acesso, entre outros; e também deve ter interface com ferramentas terceirizadas como fornecedores de soluções de pagamento (gateways), algoritmos de precificação, etc. Pelo menos quatro áreas essenciais são conectadas (Tecnologia, Finanças, Gestão do Estádio, Relacionamento, entre outras).

Para entender como várias partes podem ser conectadas, vamos nos concentrar no processo de compra dos torcedores.

Registro/Login: onde os dados primários e complexos do torcedor são armazenados (informações básicas como idade e endereço, informações segmentadas como um jogador preferido, etc.), idealmente vinculados à plataforma de CRM.

Seleção da Partida: o torcedor seleciona a partida pela qual deseja comprar um ingresso ou confirmar sua presença se for um season ticket ou sócio torcedor. Novamente, o CRM pode ser vinculado, pois o rastreamento do comprador pode estar armazenado no banco de dados para verificar se o mesmo é um sócio ativo ou não.

Setor/Assento: a escolha do assento é baseada no preço, bloco e setor dentro do estádio; nesta etapa, uma plataforma 3D pode ser disponibilizada, permitindo a visualização da visão do gramado. Além disso, modelos de negócios podem ser integrados na plataforma de ticketing (vinculada ao CRM e ao Programa de Sócio Torcedor) para aplicar descontos nos preços (plano de sócio, pessoa com deficiência, etc.).

Acesso: o torcedor precisa escolher como o seu ingresso será entregue. Poderá existir opções através de e-tickets no celular (QR Codes e Códigos de Barras), coleta física (Bilheteria ou máquinas de autoatendimento), carteirinha de sócio, etc. A plataforma de vendas pode ser vinculada ao CRM e usar essas informações de acesso para se comunicar com o torcedor através de lembretes sobre a partida adquirida, check-in, etc. Em seguida, o sistema de controle de acesso (usado por catracas e/ou scanners de mão) embutido ou não no sistema, receberá as informações para validar a entrada do torcedor.

Pagamento: Por fim, o meio de pagamento precisa ser informado (cartão de crédito, cartão de débito, pontos, etc.). O gateway faz a transação de pagamento do ambiente de vendas para o(s) banco(s) adquirente(s). Se for o caso, o programa CRM e o Programa de Sócio também podem validar a compra através de pontos de fidelidade.

Após esse processo, o torcedor poderá ter contato com outros serviços e produtos como atendimento ao cliente, revenda ou transferência de ingressos, ativação de patrocinadores e licenciados, benefícios no dia do jogo, mídias sociais, entre outros.

O exemplo acima pode ser aplicado de forma diferente, pois, cada clube possui seu próprio modelo de negócio.

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Além disso, em grandes eventos como a Copa do Mundo da FIFA e os Jogos Olímpicos, algumas interações são diferentes das dos clubes de futebol devido à sua complexidade e período de curto prazo. Mas é importante entender toda a concepção e como a área de ingressos coopera com as outras.

Primeiro, um BID (espécie de licitação/concorrência) exaustivo é lançado para definir a empresa de Ticketing que irá fornecer o sistema de vendas e emissão de bilhetes para o evento. Esta empresa trabalha em estreita colaboração com os departamentos de Ticketing e Marketing/Comercial, fornecendo tecnologia para apoiar todas as operações de emissão de bilhetes. Além disso, a Confederação ou Comitê Organizador também pode desenvolver uma plataforma exclusiva junto à uma empresa de ticketing que pode ser usada em vários torneios.

Em seguida, os departamentos Marketing/Comercial e Ticketing definem questões como categorias de ingressos, preços, calendário de vendas e design dos tickets.

Geralmente, muitos dos estádios nem sequer estão construídos, e aqueles que já existem podem precisar de adaptação para o evento.

Mesmo assim, para alcançar bons públicos (85% – 100%) e vendas, dois princípios devem ser sempre lembrados: Setorização e Categorização de Jogos. Por enquanto, apenas a Setorização será detalhada, seguida por outras áreas que integram à área de Ticketing em grandes eventos.

Setorização / Configuração

Esta equipe é responsável pela conversão do estádio em realidade no sistema de ingressos, construindo todos os assentos no sistema. Ficam em contato com o Venue Development (arquitetos e engenheiros), responsável por entregarem as plantas do estádio durante a construção ou adaptação.

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Com os planos de assentos produzidos pelo Venue Development, é uma tarefa árdua distribuir todos os públicos no mapa de assentos de acordo com as necessidades de cada um deles: autoridades, mídia, patrocinadores, federações, clubes, equipe de operações, etc. Tudo precisa ser cirúrgico, e o desafio é preencher os espaços como um quebra-cabeças. Aqui, a matemática é uma ciência exata; uma peça perdida, milhares de problemas surgirão durante as operações.

Desde o primeiro plano de assentos até o final do torneio, todo o inventário de ingressos será verificado, revisado, alocado e gerenciado.

Trabalhando junto à empresa provedora do sistema de Ticketing, o time de Setorização/Configuração decide quantos e quando os ingressos estarão disponíveis para venda.

Vendas para Grupos Especiais (Group Sales)

Alguns clientes como Federações de Futebol, Confederações, Atletas, Patrocinadores, Revendedores Autorizados, possuem necessidades de lugares em áreas específicas, quantidade diferenciada de ingressos, logística e atendimento personalizado, entre outros.

A equipe de Group Sales é o principal facilitador entre a área de ingressos e os clientes “especiais”. Para alcançar os melhores acordos, negociações e distribuição, há conexões com Comercial/Marketing, Configuração, Órgãos Oficiais, Governos, Operações.

Hospitalidade

Uma das áreas mais rentáveis, responsável pela venda de pacotes para empresas, patrocinadores, consumidores de alta renda e federações, entre outros, nas zonas de hospitalidade nos estádios. Este tipo de produto respeita especificações personalizadas e níveis de serviço como espaços privados, suítes, espaços compartilhados e semi-compartilhados, visando atingir uma capacidade plena de ocupação. Não é apenas um simples venda de assentos.

Devido às condições mencionadas acima, a área de Hospitalidade precisa trabalhar próxima a áreas como Catering, Credenciamento, Venue Development, Transporte, Operações, etc. Além disso, fornecer serviços exclusivos para atender cada contrato.

Tecnologia

Para garantir que tudo funcione adequadamente com as vendas na web (servidores, anti-hacking, software), controle de acessos (catracas, scanners de mão) e equipamentos (impressoras, notebooks, rádios, etc.), a Tecnologia é responsável pela integração de todos os aspectos técnicos dentro do departamento, estádios, bilheterias e pontos de coleta. Além disso, fornece suporte técnico durante o evento.

Operações

A equipe de Operações é responsável por entregar o produto final no estádio (controle de acesso e assentos), bilheterias e pontos de coleta.

Durante a fase de planejamento, um Gerente de Operações deve garantir todos os preparativos para os dias de jogos e para os dias que os antecedem. Durante um evento, este(a) profissional será responsável por manter tudo em ordem e por resolver os problemas.

O Gerente de Operações trabalhará em conjunto com…

  • Empresa provedora de Ticketing, para receber as ferramentas certas (ex. impressoras de ingressos) e sistema;
  • Setorização/Configuração, para evitar problemas nas emissões de bilhetes e dar suporte à operação (realocações, reimpressões de emergência, etc);
  • Venue Development, para assegurar a construção e posição correta das Bilheterias, pontos de Coleta de Ingressos, pontos para Resolução de Problemas e Controle de Acesso (catracas);
  • Tecnologia, para confirmar a internet e a energia em todos os pontos, equipamentos adequados e integração adequada com os requisitos do provedor de ingressos;
  • Logística, para receber os móveis e equipamentos corretos;
  • Segurança, para garantir um ambiente apropriado e seguro durante o controle de acesso (ajudando no gerenciamento de filas) e na área dos assentos;
  • Sinalização, para receber as informações corretas sobre os Setores, Blocos, Assentos, Fileiras, etc. que informarão os espectadores;
  • Voluntários, para ajudar e cooperar com tarefas específicas;
  • Serviços aos Espectadores, para orientar, assistir e informar os espectadores corretamente dentro da instalação;
  • Gerente da Instalação, como um parceiro e facilitador dentro do estádio.

Na maioria das vezes, a equipe de Operações, juntamente com a área de Atendimento ao Cliente, é responsável por entregar os ingressos por meio dos serviços de entrega, pois, as primeiras vendas ocorrem antes da abertura dos Centros de Coleta de Ingressos, e parte da distribuição é mundial.

Sem dúvida, a área de Ticketing em grandes eventos é complexa e muito importante. Consequentemente, é uma área vital que traz os responsáveis ​​por tornar a atmosfera dentro dos estádios inesquecível: os torcedores.

Em muitos aspectos, é uma experiência para a vida toda dentro de um ambiente internacional, composto por pessoas de diversas origens, onde o aprendizado é contínuo. Com o objetivo de vivenciar isso novamente, decidi aplicar para a FBA e, sem surpresas, encontrei um ambiente parecido.

Como mencionado anteriormente, a categorização e a setorização são importantes para alcançar bons públicos e, consequentemente, receitas.

Durante a Setorização, o estádio será fragmentado em várias partes, desde a Tribuna Presidencial até o Público Geral. O processo continuará baseado em fatores como visibilidade do campo, acessos exclusivos, posição do sol, etc. Tudo isso irá construir o cenário de precificação e, mais importante, a definição dos públicos-alvo.

Para o EURO 2020, a setorização do público geral é dividida em três categorias, tendo a visão de campo como fator determinante, seja em setor superior ou inferior (CAT 1 para as centrais, CAT 2 para as curvas e CAT 3 para atrás dos gols).

Nos clubes de futebol, isso não é muito diferente, ainda que exista uma boa variedade de setores. A principal diferença é que, uma vez que o clube define uma setorização, ela será usada ao longo de vários anos. Pequenas mudanças poderão ocorrer para corrigir desigualdades ou outros problemas.

Com relação à categorização dos jogos, após ter definido a setorização, é um dos fatores chave para definir o preço de forma inteligente para toda a temporada.
Nos grandes eventos, as fases do campeonatos são determinantes: grupos (exceto Abertura), oitavas de final, quartas de final, semifinais e a grande final.
Para os clubes de futebol, é baseado em séries históricas, rivalidades, significância do adversário, atratividade do campeonato, etc. Ao utilizar dados históricos, os clubes podem desenvolver algoritmos para ajudar nessas decisões.

Quanto mais atraente for o jogo, mais caro será o preço do bilhete e vice-versa. O fator essencial é alcançar um equilíbrio  entre público e renda durante toda a temporada ou campeonato.

Ao categorizar os jogos e o divulgando com antecedência, é permitido ao torcedor fazer as contas de quanto gastará durante a temporada, possibilitando a venda e melhor distribuição dos produtos (season tickets, pacotes, descontos para planos de sócio, etc.). O que deixa o processo de compra mais honesto.

Essas práticas (Setorização e Categorização) são essenciais na área de ticketing, pois, quando um estádio está bem setorizado, permite que diferentes tipos de público possam assistir aos jogos de acordo com as suas particularidades (renda, assiduidade, vantagens, etc.), e ao categorizar as partidas, o clube demonstra respeito ao seu torcedor ao informar o valor que ele gastará ao longo de uma temporada, possibilitando um melhor planejamento na oferta de seus produtos de acordo com a necessidade dos torcedores.
Quando ambas técnicas trabalham juntas, espera-se que o estádio tenha sempre públicos e receitas significativas.

Como mostrado ao longo de todo o texto, a venda de ingressos é apenas uma pequena parte de uma complexa e fragmentada estrutura. O organizador precisa se preocupar com os diferentes aspectos que influenciarão todas as partes interessadas, desde o primeiro mapa de assentos até o acesso do torcedor ao seu lugar – considerando que tecnologia, análise de dados, relacionamento, metodologias de precificação e hospitalidade estão desempenhando papéis significativos. Aqueles que encontrarem a melhor integração entre serviços e funções fornecerão a melhor experiência para os torcedores.

Ricardo Brito Teixeira é especialista em grandes eventos esportivos tendo atuado na área de Ticketing da Copa do Mundo FIFA em 2014, no Comitê Organizador Rio 2016 e no Palmeiras. Também gerenciou projetos no Mundial de Clubes da FIFA 2018 e na Copa da Ásia 2019. Atualmente, faz mestrado profissional na The Football Business Academy, um programa com dedicação exclusiva ao futebol ensinado pelos melhores executivos do mercado e que proporciona um grande networking na indústria.

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Clique aqui para ler o texto original, em inglês, no blog da FBA.

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