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Su casa, mi casa | Por Felipe Blanco

O “fator casa” sempre foi um diferencial para a obtenção de vantagem diante dos adversários que atuam longe de seus domínios. Fora a pressão da torcida adversária, o ambiente é muitas vezes hostil – tal hostilidade se estende do caminho ao estádio até a subida para o gramado.  Antigamente era comum a imposição de pequenos impasses para que o visitante tivesse as piores condições possíveis ao chegar para jogar. Por exemplo, ventilador e ar condicionado quebrados, lâmpadas queimadas, chuveiros frios, até mesmo a aplicação de produtos de limpeza que tornavam o vestiário de difícil permanência. Estes eram hábitos corriqueiros no que os saudosistas chamam de futebol raiz.

Mesmo atualmente, quando o assunto é clássico, a rivalidade pode ultrapassar qualquer barreira. Quem não se lembra de quando o vestiário do São Paulo Futebol Clube foi invadido por um gás de pimenta, no intervalo do clássico contra o Palmeiras, no até então Palestra Itália, em 2008? O Palmeiras foi condenado meses depois, mas o autor do ato não foi conhecido.

E a pressão que o vestiário do Boca Juniors oferece aos seus rivais, situado logo abaixo da arquibancada onde se acomoda a torcida La 12, a maior organizada do time argentino? Durante o tour a La Bombonera, em um dos estádios mais famosos do mundo, os guias ensinam os visitantes a pular bastante para pressionar o adversário que se concentra abaixo deles.

Nos tempos atuais, essas práticas diminuíram drasticamente, graças à profissionalização da modalidade e ao trabalho das federações, que fiscalizam todos os estádios e exigem boas condições para todos os atletas e comissões.

Este ano, algumas ações com relação aos vestiários dos visitantes chamaram atenção. Alguns clubes estão tornando a casa do adversário mais aconchegante para suas equipes. Em abril de 2018, o Corinthians foi ousado ao personalizar o vestiário visitante do Palmeiras, em pleno Allianz Parque. As cores verde e branca foram substituídas pelo alvinegro corinthiano.

A equipe sagrou-se campeã estadual, na casa do seu arquirrival, mesmo com o estádio inteiro tomado pela torcida palmeirense, que esgotou os ingressos, em partida de torcida única.

Em mais um clássico de alvinegros contra alviverdes, Guarani e Ponte Preta tiveram a mesma atitude. O dérbi da cidade de Campinas-SP é um dos maiores clássicos do país em termos de rivalidade. As duas equipes, que em 2018 se encontraram duas vezes pelo campeonato Brasileiro da série B, não se enfrentavam desde 2013, por não frequentarem as mesmas divisões.

O primeiro confronto foi no estádio Brinco de Ouro da Princesa, no dia 5 de maio. Naquele duelo, a equipe Ponte Pretana decorou o vestiário bugrino com as suas cores e adicionou cartazes para amenizar a pressão do adversário, que preparou uma recepção de arrepiar para receber seus atletas.

Foto do vestiário visitante – Brinco de Ouro da princesa

Recepção da torcida do Guarani

Vídeo da recepção pré-jogo

Mas foi a macaca quem venceu a partida, pelo placar de 3 a 2, no primeiro clássico de torcida única. Na festa pós-jogo, devido à personalização, as imagens pareciam até ter sido feitas dentro do próprio vestiário da Ponte, em seu estádio.

“Chegamos um pouco antes e fizemos tudo para criar uma atmosfera positiva aos jogadores quando eles chegassem, e acredito que isso deu certo. Como nossa torcida não estava presente, queríamos que eles, de alguma forma, sentissem essa vibração”, acrescenta Fabiana Fantini, coordenadora do departamento de marketing.

Pós jogo no Twitter da Ponte Preta

Pós jogo Ponte TV

No duelo de volta, na último sábado, dia 25 de agosto, foi a vez do Guarani visitar a Ponte, no Moisés Lucarelli. Os bugrinos “pintaram” o vestiário alvinegro com as suas cores, e foram além: trocaram as lâmpadas do túnel da macaca por lâmpadas verdes. O resultado foi efetivo, visto que o vestiário ficou completamente verde e branco, proporcionando o clima que os visitantes queriam.

Vídeo no Instagram do Guarani

Desta vez a equipe visitante não conseguiu os três pontos, mas ação rendeu um bom vídeo para a TV Guarani, que explorou bem a personalização, motivou seus atletas e até provocou os rivais. “Mesmo com a ausência da torcida, a delegação Bugrina se sentiu em casa no dérbi 192. Em uma demonstração de competência, ousadia e inovação, o Departamento de Marketing do Guarani transformou o vestiário do estádio adversário em território Alviverde. Diferentemente da tentativa, frustrada, do adversário no primeiro turno, o Marketing Bugrino mostrou como o trabalho deve ser feito e ganhou notoriedade na mídia pela exibição do resultado antes mesmo da bola rolar.” Foram os dizeres da publicação do perfil oficial do Guarani no Instagram.

Video pós jogo Guarani

Este tipo de ação é inovadora no futebol brasileiro. Com a crescente onda dos vídeos de bastidores, o momento do vestiário se torna cada vez mais comum ao público. E a oportunidade de monetizar esse momento já é realidade. Mas o que você quer dizer com monetizar este momento? Refiro-me a exposição que este momento propicia. Os consumidores de futebol não restringem suas atenções apenas para o tempo dos atletas em campo, nos 90 minutos. Os vídeos que mostram a intimidade e a preparação dos jogadores atraem cada vez mais espectadores, fazendo com que o torcedor crie laço e intimidade com os atletas, mesmo sem conhecê-los. Este é um momento de emoção, como se você adentrasse em lugar proibido, e pudesse matar sua curiosidade do que acontece naquele ambiente tão restrito, que somente os clubes podem entregar aos seus fãs.

O momento do vestiário, que tem sido exposto em diversos canais de clubes, pode gerar renda extra aos cofres das equipes. Se atualmente os canais expõem seus patrocinadores de uniforme e produtos que estão presentes no vestiário, um novo produto pode ser a personalização do vestiário exclusivo para cada partida. A equipe que atuará fora de casa pode firmar uma parceria apenas para momento do vestiário, divulgando sua marca no momento íntimo dos atletas e tão desejado para a torcida. Isso pode motivar as equipes visitantes a vencer os confrontos, render parcerias e fortalecer ainda mais os canais de TV dos clubes. Já imaginou uma marca rival da Allianz, ativando um patrocínio em pleno estádio alviverde? O que virá a partir daí? Aguardemos os próximos capítulos do futebol brasileiro.

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